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Intermissão - Dando Sentido ao Absurdo

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Selayde, a terra dos demônios, estende-se ao norte do grande continente.
Os edifícios de pedra forjados por feitiços estão muito longe da arquitetura do capital humana por uma questão de necessidade. Exceto pela breve pausa proporcionada pelo verão, as terras estão constantemente cobertas por uma camada fresca de neve recém-caída. Devido à forte afinidade mágica dos demônios, há pouca coisa em suas vidas diárias que não seja tocada pelo poder da magia.
O contorno imenso e imponente do castelo do Lorde Demônio assoma ao longe. Suas paredes são negras como piche e cobertas de estranhas gravuras. As torres de vigia que se erguem da forma sinistra sobem tão alto que você tem que esticar o pescoço apenas para ver seus picos. Apenas ficar de pé diante disso é o suficiente para encher alguém com uma sensação de pavor.
Na realidade, porém, os ocupantes não são nem de longe tão aterrorizantes quanto o exterior do prédio sugere.

Três demônios estão sentados na sala de jantar no primeiro andar, facas e garfos na mão, banhados pelo brilho suave de velas colocadas estrategicamente ao redor da sala. Uma lareira crepitante torna o quarto bastante confortável, apesar do frio cortante lá fora.
Um dos ocupantes da sala é Neigass, a hematófaga que encontrou q Flamm e a Sara em Anichidey. O clima pouco fez para inspirá-la a cobrir seu corpo amplamente exposto. Sentada em frente a ela está seu companheiro Chefe Demônio Tsyon, o Fogo-Fátuo. A gola de sua camisa está erguida, como se estivesse travada no lugar.
Ao lado do Tsyon está sentada uma jovem vestida com um vestido branco, sua cadeira tão alta que seus saltos brancos balançam livremente no ar. Este é Sheitoom, a Lorde Demônio. Aos olhos humanos, ela não parece ter mais de doze anos de idade.

Sheitoom falou assim que a Neigass estava prestes a enfiar uma garfada de carne em sua boca. [Como foi sua investigação do laboratório?] (Sheitoom)

Neigass fez uma pausa, uma leve carranca no rosto.
A entrada da noite foi um enorme sauté de cabra acompanhado de molho de cogumelos. A refeição foi feita pelo terceiro e último membro dos Chefes Demônios, Dhiza, conhecido como 『O Pântano Insondável』, cuja culinária seria superior, mesmo nos melhores restaurantes da capital humana. A carne é macia além da crença e deliciosamente úmida. Os sucos da carne misturados com o molho ligeiramente ácido para criar uma sinfonia de sabor que praticamente implorou para ser devorado.
Considerando que a Neigass pulou o almoço para poder saborear ainda mais a comida do Dhiza, essa interrupção pareceu um golpe no corpo.

[Nng. Encontrei os materiais, como esperado. Parecem ter cerca de trinta anos. Ah, e eu encontrei uma daquelas criaturas com um núcleo nela] (Neigass)

Este é, é claro, o ogro espiral que a Flamm encontrou no complexo da caverna.

[Eu entendo. Trinta anos atrás... Isso colocaria na época da guerra humano-demônio, sim?] (Sheitoom)

Sheitoom está se referindo ao momento em que um exército humano invadiu suas terras. Foi uma batalha de curta duração, não importa quantos homens eles tivessem, os humanos não tinham chance contra a poderosa magia dos demônios. O moral das tropas humanas estava no fundo do poço antes mesmo que as primeiras escaramuças começassem, o que levantou a questão do que seu rei planejava alcançar com tais táticas descuidadas.

[Meu melhor palpite é que eles estavam tentando criar uma nova geração de soldados para a próxima guerra], disse Neigass.
[Você acha que eles vão tentar de novo?] (Sheitoom)
[Considerando que eles deram uma chance ao seu plano original e estúpido da última vez, não vejo por que eles não tentariam novamente se eles realmente conseguissem reforçar seu poderio militar] (Neigass)
[Eu ainda não vejo por que eles nos atacariam em primeiro lugar...], Sheitoom disse.
[Os humanos são muito egoístas. Enquanto houver terra lá fora, eles vão querer tomá-la] (Neigass)
[Eu simplesmente não entendo o que seus líderes podem estar pensando] (Sheitoom)
[Eu sei, não é?] (Neigass)

A última guerra tinha sido brutal. Os demônios fizeram tudo o que podiam para minimizar as baixas humanas, mas as tropas humanas tiraram vantagem disso e encheram suas linhas de frente com crianças-soldados. Os demônios normalmente pacíficos, enfurecidos com esse comportamento imprudente, redobraram seus ataques aos adultos restantes.
A descoberta da Neigass apenas confirmou o que há muito se falava em Selayde.

[Havia tantos corpos, tanto humanos quanto animais, que perdi a conta. Cada um deles tinha essa estranha formação espiral em seu rosto. Parece que a natureza dos líderes humanos nunca muda] (Neigass)
[Tudo isso e eles não podem nem controlar essas coisas? Mais importante, onde eles encontraram o poder para fazer isso?] (Sheitoom)
A voz do Tsyon assumiu um tom brincalhão e provocador. [Talvez o selo do Lorde Demônio esteja enfraquecendo?], ele disse.
Sheitoom estufou as bochechas. [Sem chance! Eu nunca tive um único selo meu quebrado, não desde que comecei meus estudos! Além disso, Dhiza está lá comigo!] (Sheitoom)
[Whoa, whoa, não há necessidade de ficar tão irritada, sua Senhoria] (Tsyon)
[Você está tentando me irritar, Tsyon?? Lorde Demônio isso, Senhoria aquilo. Apenas me chame pelo meu nome, tudo bem?] (Sheitoom)
[Ei, você é quem está nos chamando de Chefes Demônios. Eu só achei que parecia certo] (Tsyon)
[Ugh... não é como se eu tivesse escolha. As pessoas estão ficando frustradas. Eu preciso de uma diversão] (Sheitoom)

Os demônios são geralmente um povo equilibrado, mas mesmo sua paciência tem seus limites sob ataque quase constante. Os Chefes Demônios deveriam ser a resposta para esse problema. Embora tenham sido nomeados e titulados como tal pelas razões ostensivas de lutar contra os heróis, na verdade, eles geralmente se movem e agem de forma independente.

[Eu simplesmente não entendo o ponto em nos dar um nome tão bobo se é tudo para mostrar, de qualquer maneira] (Tsyon)
[Eu realmente não estou interessada em ouvir reclamações de um idiota com um colarinho levantado!] (Sheitoom)

Quando a Sheitoom e o Tsyon caíram em mais uma de suas infames brigas de gritos, Neigass olhou por cima do ombro da Sheitoom e pegou o olhar do Dhiza. Dhiza, vestido com um fraque e usando um monóculo, sorriu ironicamente. O gentil demônio havia sido acolhido como órfão pelo Lorde Demônio há várias gerações e serve como mordomo da família desde então.

[Ei, ei... Agora não vá bater no meu estilo!], Tyson objetou. [Sou um criador de tendências total, você me ouviu?] (Tsyon)
[Ah, mas eu estou! O que há com você ir e endurecer seus colarinhos, afinal? Imagine como deve ser andar pela cidade com você! Sério, você poderia ser bonito se tentasse, mas esse colarinho estraga todo o efeito] (Sheitoom)
[Nnnggg—cuidado, mocinha. Você cruzou a linha! Por que não vamos lá fora e damos uma olhada pela cidade então, hein?] (Tsyon)
[Com prazer! Eu vou expor com prazer esse seu adereço para todos verem] (Sheitoom)

Tsyon e Sheitoom estão debruçados sobre a mesa neste momento, suas vozes subindo, quando foram interrompidos pelo som do Dhiza pigarreando. A sala de jantar instantaneamente ficou em silêncio.

[Silêncio na mesa, por favor] (Dhiza)
[... Desculpe] (Tsyon)
[Minhas desculpas] (Sheitoom)

Os dois rapidamente se acomodaram em seus assentos, embora não pudessem resistir à oportunidade de lançar olhares de reprovação um para o outro. Sentindo que outra briga de gritos estava prestes a decolar, Dhiza travou os olhos com a Neigass. Ela deu um aceno firme e estendeu a mão, palma para a frente, na direção da Sheitoom, fazendo com que a Lorde Demônio flutuasse no ar antes que ela tivesse a chance de arrancar um pouco de carne do prato do Tsyon em vingança.

[O que você acha que você está fazendo, Neigass??], Sheitoom balançou os braços e os pés com toda a força, mas sua luta não foi páreo para a magia do vento da Neigass. Neigass carregou a garota menor pelo ar e direto sobre o Tsyon antes de deixá-la cair firmemente em seu colo. Tanto o Chefe Demônio quanto a Lorde Demônio imediatamente ficaram com um tom brilhante de vermelho.
[Heh. Pelo menos isso fez vocês dois se acalmarem] (Neigass)
[Não sei se deveria estar feliz ou perturbado por isso ter sido tão eficaz] (Dhiza)
[E-ei, somos nós que deveríamos estar irritados aqui!] (Tsyon)
[I-isso mesmo! Eu simplesmente não sabia o que dizer depois de ser colocada em uma posição tão embaraçosa!!] (Sheitoom)



Mas, apesar de seus protestos, Sheitoom não fez nenhum esforço para sair do colo do Tsyon, nem ele fez qualquer tentativa de despejá-la.

Neigass continuou a pressionar o ataque. [Vocês dois realmente não mudaram nada, não é?] (Neigass)
[Como se você fosse alguém para falar], Tsyon atirou de volta.
[Eu não sei, Tsyon. Você parece gostar muito do seu título de Chefe Demônio, não é? Apresentando-se como Tsyon dos Grandes Chefes Demônio toda vez que entramos em uma briga...] (Neigass)
[Isso é verdade?], Sheitoom perguntou.
Tsyon murmurou um pouco, procurando as palavras. [Eu, uh, bem... eu meio que me empolgo no calor das coisas, é tudo] (Tsyon)

Ele não consegue mentir para a Sheitoom. Afinal, eles se conhecem a maior parte de suas vidas, e ele pensa nela como uma irmã mais nova. Ficou claro para a Neigass que ele realmente ama o título de Chefe Demônio. Ele e a Lorde Demônio só se provocam o tempo todo porque são próximos.

[Vocês dois nunca mudam, não é?], Neigass repetiu.
Tsyon esticou o lábio inferior e olhou para ela. [Cale a boca!] (Tsyon)
Isso só conseguiu arrancar uma risada calorosa da Neigass. Ela continuou, [Bem, pelo menos os heróis não parecem ter percebido que os Chefes Demônio são apenas um clube infantil legal formado por um monte de amigos] (Neigass)
[Não foi de propósito], disse Sheitoom. [Eu reuni as pessoas mais poderosas que eu conhecia, e por acaso são vocês. Além disso, você está me obtendo resultados, então quem se importa?] (Sheitoom)
[Resultados, hein? Eu não sei como me sinto sobre destruir aldeias, para ser honesta] (Neigass)
[É o que é. Se não agirmos, nosso povo continuará a ficar chateado. Além disso, você não está realmente matando ninguém... certo?] (Sheitoom)
[Claro que não] (Neigass)

Sheitoom está desesperadamente relutante em invadir terras humanas por medo de desencadear outra guerra prolongada. Mas o fato é que os humanos estão invadindo ativamente cidades demoníacas, e seu povo precisa vê-la fazendo algo a respeito.
Depois de lutar com o problema por algum tempo, ela consultou Dhiza e teve a ideia de destruir aldeias enquanto poupava a vida de seus habitantes. Os Chefes Demônio avisavam as aldeias com bastante antecedência antes de atacarem, dando aos seus habitantes tempo para fugir. Se alguém ainda estivesse por perto quando eles chegassem, Neigass ou Tsyon os escoltariam pessoalmente para a segurança. Por mais bizarro que parecesse, essas medidas ajudaram a reprimir a raiva da população dos demônios.

[O progresso dos heróis em nossas terras está diminuindo. Talvez os humanos estejam lentamente chegando à ideia de que realmente não queremos lutar] (Sheitoom)

Parando para pensar sobre isso, os heróis não tinham feito muito progresso ultimamente, não é? Além disso, seu time parece estar encolhendo. Neigass sabe que há outros fatores em jogo aqui. Ela sabe disso desde que se encontrou com a Flamm e tomou posse do núcleo quebrado.


◇ ◇ ◇


Após o jantar e uma deliciosa fatia de bolo de sobremesa, Neigass finalmente pegou o núcleo e o mostrou a Sheitoom.

[Isso é...] (Tsyon)
[Eu peguei daquela garota Flamm, um dos membros do time do herói] (Neigass)
Dhiza se inclinou para perto e examinou o objeto com grande interesse. [Hum. parece estar quebrado] (Dhiza)
Tsyon cruzou os braços e franziu a testa. [Apesar de nossos melhores esforços, nem nós conseguimos destruí-lo. Mas uma coisinha como aquela Flamm conseguiu fazer isso? Ela é a inútil com as estatísticas zeradas, não é?] (Tsyon)
[Isso mesmo. Não faço ideia de como ela foi capaz de fazer isso. Ela tem algum tipo de poder misterioso] (Neigass)
[... Reversão?] (Dhiza)

Os Chefes Demônio nunca tinham visto a Flamm usar magia alguma, ela simplesmente não tinha estatísticas para isso. Mas tudo é diferente, agora.

Dhiza murmurou em voz alta. [O poder de reverter a direção da hélice giratória colocada em movimento pela Origin...] (Dhiza)
[Deve ser isso. Afinal, ela é a única que já foi capaz de quebrar um núcleo] (Neigass)

O grau de força que a Flamm havia usado contra aquele ogro bizarro é notável. Sua força física, seu prana, aquele poder sem forma que quase parecia se assemelhar a magia – tinha que ser devido à sua habilidade Reversão.

[Acha que é por isso que ela foi escolhida para ser uma heroína?] (Dhiza)
[Ela era apenas uma garotinha de algum lugar nos arredores, você sabe. Se a Origin não a tivesse chamado para se juntar aos heróis, então ela provavelmente nunca teria descoberto seus poderes em primeiro lugar] (Neigass)
Tsyon soltou um suspiro. [Eu fico querendo manter seus inimigos por perto, mas eles devem ter tido alguma razão para ir encontrá-la e recrutá-la. Eu simplesmente não entendo o que essas pessoas estão pensando. eu realmente não entendo] (Tsyon)

Um profundo silêncio pairou sobre a sala antes da Sheitoom finalmente falar.

[Independentemente do raciocínio deles, precisamos garantir que nem os heróis nem a garota Flamm cheguem perto do selo. Isso não é apenas para o nosso próprio bem, mas para a segurança do mundo inteiro] (Sheitoom)

A convicção é clara em sua voz.

[Não importa o que aconteça, não podemos deixar que a astuta deusa Origin faça o que quer] (Sheitoom)


◇ ◇ ◇


Mais uma vez, o grupo não conseguiu chegar ao destino pretendido a tempo. Aborrecimento está escrito no rosto do Jean quando ele saiu da sala de teletransporte. O resto do grupo compartilhava seu sentimento de angústia, especialmente por ter perdido a Flamm e a Eterna em rápida sucessão.
Linus queria desesperadamente evitar que ao time se dissolvesse, mas por mais que tentasse, nenhuma palavra veio à mente. Por fim, ele decidiu se retirar para seu quarto para refletir sobre o problema. Maria observou com grande preocupação antes de correr atrás dele.
Isso deixou a Cyrill e o Gadhio sozinhos na sala de teletransporte. A mulher mais jovem foi para a saída, parecendo desanimada, quando de repente o Gadhio a chamou.

[Uma palavra, Cyrill?] (Gadhio)
Ela parou e se virou. Era raro ele iniciar uma conversa. [O que aconteceu, Gadhio?] (Cyrill)
[Estou pensando em sair deste time. A próxima missão será a minha última], as palavras saíram facilmente, como se ele estivesse discutindo o tempo.
[Eu entendo. Então até você está nos deixando?] (Cyrill)

Ela pressentiu que isso poderia acontecer. Ele sempre gostou da Flamm e é próximo da Eterna. Com elas desaparecidos e o futuro do grupo ficando menos claro a cada dia, parece improvável que um aventureiro talentoso como ele fique por perto. Afinal, nem fama nem fortuna o levaram a se juntar a eles em primeiro lugar.

[Sinto muito, mas, francamente, não vejo nenhuma necessidade real de continuar a acompanhá-la nesta jornada] (Gadhio)
[Sem necessidade real? Você está dizendo que o Lorde Demônio não precisa ser parado?] (Cyrill)
[Lorde Demônio tornou-se um termo genérico para todas as coisas más, ultimamente. A verdade real é que o Reino está procurando dominar os demônios em conflitos armados] (Gadhio)
[Demônios que atacaram nosso povo e mataram dezenas no processo] (Cyrill)
Gadhio balançou a cabeça. [Os humanos começaram essa guerra] (Gadhio)
[O que? Foi-me dito que os demônios foram os que invadiram] (Cyrill)
[O Reino garante que seus livros de história o pintem da melhor maneira possível. A concepção popular é que os demônios, que eram maus, começaram a surgir cerca de cinquenta anos atrás. Depois de vinte e tantos anos de desconfiança, o Reino entrou em guerra com eles] (Gadhio)
[Algo aconteceu para desencadear a guerra?] (Cyrill)
[Não particularmente, não. A família real simplesmente chegou à conclusão de que os demônios eram nossos inimigos. Havia pouco contato entre os dois povos na época, mas posso dizer com certeza que não foram os demônios que iniciaram o conflito] (Gadhio)
[Então, os humanos são os invasores... Então por que estamos tentando destruir o Lorde Demônio?] (Cyrill)
[Como a igreja diz, a Criadora Divina Origin considera os demônios uma praga sobre o mundo. Se você acredita ou não é com você] (Gadhio)

Ele provavelmente poderia ter deixado essa última parte de fora. Ele sabe que a Cyrill sente o peso das expectativas das pessoas em seus ombros, ela não pode desistir de sua jornada tão facilmente. Gadhio não conseguiu encorajá-la a continuar, então ele deixou uma abertura para ela fazer o que bem entendesse.

[Existem muitas forças das trevas se movendo em segundo plano], disse ele. [Não se deixe enganar por sua embalagem bonita. Se você não tomar cuidado, essa escuridão vai te engolir] (Gadhio)
[Não sei se consigo fazer isso...] (Cyrill)
[Nem eu. É por isso que confio não apenas no que as pessoas me dizem, mas também no que vejo com meus próprios olhos] (Gadhio)
[O que eu vejo...?] (Cyrill)

Cyrill não pôde deixar de se perguntar se seu impulso imprudente a trouxe até aqui. Seus amigos estão saindo um após o outro, e ela não consegue mais controlar suas habilidades adequadamente. Talvez esta seja sua chance de começar de novo.

[Há uma última coisa, e é importante...], Gadhio olhou para a porta para se certificar de que não havia ninguém por perto. [Fique de olho na Maria] (Gadhio)

Isso é incomum vindo do Gadhio. Ele é um homem rigoroso e estóico que nunca fala mal de alguém pelas costas.

[Por que você diz isso?] (Cyrill)
[Sinto que ela está escondendo alguma coisa. Além disso, ela é um membro da igreja, então não faz mal ser especialmente cautelosa com ela. Eu sei que acabei de dizer para confiar no que seus próprios olhos mostram, mas acho que vale a pena manter isso em mente] (Gadhio)
Com isso, ele se moveu em direção à porta. Cyrill ficou com seus pensamentos por um momento antes que ela se lembrasse de algo importante e rapidamente gritou por seu companheiro. [Espere! Mais uma coisa!] (Cyrill)
Gadhio parou e se virou. [Sim?] (Gadhio)
[Eu estava, umm... eu estava pensando sobre a cidade natal da Flamm, e...] (Cyrill)
Gadhio soltou um suspiro incomum. [Eu estive pensando sobre ela também. Se algum dos meus trabalhos me levar naquela direção, pretendo passar por lá] (Gadhio)
[Obrigada, Gadhio] (Cyrill)
[Apenas cumprindo meu dever], ele acenou com a mão e começou a andar de novo pelo corredor.

Cyrill sabe que ela não tem o direito de verificar pessoalmente a Flamm, mas tem que pedir. Desde que a Origin a escolheu para ser a heroína que todos esperavam, Flamm é a única pessoa que ela realmente considera uma amiga.


◇ ◇ ◇


Linus e Maria saíram do castelo e caminharam lado a lado pela cidade.
Linus tem sua própria suíte no castelo, onde as pessoas arrumam seus equipamentos, preparam suas refeições e geralmente cuidam de todas as suas necessidades, mas a perspectiva parece apertada e hostil no momento. Ele decidiu, em vez disso, passar a noite em um hotel no Distrito Leste.

[Você não precisa voltar para a catedral?], ele perguntou a Maria.
[Há algo de errado comigo me preocupando com você, Linus?] (Maria)
[E, uh, não. Claro que não. Estou realmente muito feliz em ouvir isso. Mas eu pareço tão ruim assim?] (Linus)
[Quero dizer, é bastante óbvio que algo está realmente incomodando você. Como uma mulher de habito, eu mal podia olhar para o outro lado] (Maria)
[Desculpe pelo incômodo...] (Linus)
[Não é nada, especialmente considerando as circunstâncias] (Maria)

Ele realmente tem muito em mente - Flamm e Eterna se foram, e sua jornada está se arrastando muito mais do que deveria. Depois, houve a má atitude constante do Jean e o fato da Cyrill estar presta em uma fossa. Como se isso não bastasse, parece que o Gadhio sairá do time a qualquer momento.

[Ei, Maria...] (Linus)
Ela inclinou a cabeça para o lado - um gesto adorável. [Sim?] (Maria)
Linus parou para olhar para ela, sua expressão ficando sombria. [O que você diria se... se eu te dissesse que queria sair do time e te pedisse para vir morar comigo?] (Linus)
Os olhos da Maria se arregalaram com a confissão repentina. Seu coração começou a acelerar, mas não é uma sensação totalmente desagradável. [A igreja... eles viriam atrás de mim] (Maria)
[Eu sou muito bom em fugir da captura] (Linus)
[E onde você planeja me levar?] (Maria)
[Eu não tenho um lugar específico em mente, na verdade. Eu só quero viajar pelo mundo. Talvez encontremos alguns lugares interessantes pelo caminho] (Linus)
Maria fechou os olhos, imaginando a cena. [Isso... isso soa absolutamente esplêndido, Linus], parecia o céu, comparado à sua jornada cansativa para depor o Lorde Demônio. Mas...
[Há algo errado?], Linus perguntou.
[Não é que eu não queira viajar pelo mundo com você. Realmente, estou impressionada que você me peça para acompanhá-lo. Acho que poderíamos ser felizes juntos. É só isso...] (Maria)
[Você não pode se deixar ser feliz até que todos os demônios tenham sido expulsos deste mundo?] (Linus)
Linhas de expressão profundas marcou o rosto de Maria. [Então você entendeu] (Maria)

Sua fome de vingança a segue como uma maldição. Mesmo que ela se apaixone e encontre sua própria chance de felicidade, ela sabe que o desejo nunca a deixará em paz até que o último demônio esteja morto.

[Vou ser completamente honesto aqui – fiz uma pequena pesquisa sobre você, Maria. Me desculpe por bisbilhotar] (Linus)
[Eu não me importo. Estou apenas lisonjeada que você se interessou por mim] (Maria)
[Você realmente é uma santa... ou uma freira, pelo menos] (Linus)
[Eu não sou tão gentil com todo mundo. Se mais alguém tivesse feito o que você fez, eu não perdoaria. Mas eu tenho que perguntar... acho que isso significa que você sabe sobre minha cidade natal, certo?] (Maria)
[Eu sei que foi destruída por demônios quando você tinha oito anos, sim] (Linus)
Maria olhou para longe enquanto se lembrava daquele dia fatídico dez anos atrás. [Isso mesmo. Quando o sol nasceu na manhã seguinte, eu era a única que restava viva em meio às ruínas] (Maria)

A memória está gravada em seu cérebro. Parece que tinha acontecido ontem.

[Todo mundo que eu amei foi cortado em pedaços – esmagado – empalado – queimado. Lembro-me de todos] (Maria)
[Eu... eu sinto muito] (Linus)
Ela cerrou os punhos quando um olhar de ódio cru tomou conta de seu rosto. [As histórias de demônios amigáveis são mentiras, todas mentiras. Essas... coisas tinham tanto prazer em matar a todos. É por isso que eles devem ser destruídos] (Maria)

Tudo o que ela disse parece verdade. E, no entanto, até onde o Linus pode dizer, os demônios não estavam mentindo quando disseram que nunca mataram nenhum humano.

[Sinto muito por estragar o clima], disse ele.
[Não, de jeito nenhum. Além disso, fui eu quem trouxe isso] (Maria)

A história sombria da Maria é apenas mais uma razão pela qual o Linus está tão apaixonado por ela. Ele quer ficar ao lado dela e apoiá-la em tudo que ela fizer.

Finalmente, Maria falou novamente, sua voz quase um sussurro. [Ainda acredito que deveria colocar isso acima de tudo, até da minha própria vida] (Maria)

Embora ele a tenha ouvido, Linus não respondeu. Por mais difícil que tenha sido, ele sabe que esta é uma linha na areia que ele simplesmente não deve cruzar. É uma decisão que a própria Maria terá que tomar.
Os dois ficaram ali em silêncio, Maria olhando para os pés com um olhar desamparado no rosto.

Depois de alguns momentos tensos, Linus finalmente bateu palmas e soltou um grito animado. [Acabei de me lembrar! Há uma grande sorveteria nas proximidades. Apenas o tipo certo de lugar para levantar nossos espíritos. O que você acha?] (Linus)
Maria sorriu. [Soa bem. Confesso que tenho uma pequena queda por guloseimas, embora proíbam lanches na catedral] (Maria)

Ela é realmente linda quando relaxa e se permite sorrir assim. Linus prometeu a si mesmo que ficaria ao lado dela até o dia em que ela pudesse deixar de lado todo o ódio dentro dela e sorrir facilmente mais uma vez.


◇ ◇ ◇


O sol estava se pondo no momento em que o Jean saiu da sala de teletransporte, resmungando com raiva para si mesmo enquanto caminhava para fora do palácio escuro. [Aventureiro Classe S? Okay, certo! Eu não vi esses idiotas fazerem uma única coisa digna dessa classificação. Eles não são nada mais do que covardes inúteis!] (Jean)

Ele continuou seu discurso durante todo o caminho de volta ao seu quarto, onde imediatamente desabafou sua raiva em sua mesa até que seu punho estava machucado e sangrando. Ele jogou livros e papéis ao redor da sala, então finalmente derrubou a estante inteira com um estrondo.
Sua explosão não foi totalmente sem razão - Gadhio tinha acabado de lhe dizer que ele vai deixar o time. Com quão pouco progresso eles fizeram ultimamente, sua partida seria o último prego no caixão de sua missão. Para piorar as coisas, isso provavelmente enfraquecerá ainda mais a determinação da Cyrill e ameaçará a reputação que o Jean havia construído para si mesmo.

[Qual diabos é o problema dele, afinal?! Uma vez que a jornada esteja completa, podemos viver o resto de nossas vidas no colo do luxo, desfrutando da adoração das pessoas! Teremos títulos concedidos pela família real! Eu pensei que os aventureiros eram tudo sobre o dinheiro. Desde que pague, quem se importa com o resto?? E, além disso, com que frequência se tem a chance de trabalhar com um gênio do meu calibre?] (Jean)

Ele cerrou os punhos com força e respirou fundo enquanto as semanas e meses de fúria reprimida se derramavam. Infelizmente, isso fez pouco para aplacar sua raiva.
Por que a jornada está indo tão mal com alguém de seu brilhantismo para pastoreá-los?
Jean não conseguia se lembrar de uma única vez em sua vida em que tivesse falhado. Mesmo quando as pessoas tentavam enganá-lo, por ciúmes, sem dúvida, ele sempre conseguia manter um comportamento calmo e resolver todos os problemas que lhe eram apresentados. Ele sempre foi um solitário, nunca vendo muita necessidade de amigos. Ele se jogou totalmente em sua pesquisa e foi recompensado em espadas, aprendendo a lançar magias que estão além até mesmo dos melhores magos do Reino. Jean estava orgulhoso por uma razão. Suas conquistas falam por si!
E, no entanto, aqui está ele, contra uma parede que ele simplesmente não consegue superar.

[Haah... haaah...] (Jean)

Ele caiu em sua cadeira uma vez que se acalmou um pouco, pegando sua pena. Mergulhando a ponta em um frasco de tinta, Jean pegou uma folha de papel descartada da mesa e começou a escrever. Seu rosto estava tão perto do papel que sua bochecha quase o roçou, e sua mão tremia com a força com que apertava a caneta enquanto listava teoremas mágicos.
Ele soltou outro grunhido irritado com a futilidade de tudo isso e amassou o papel em uma bola antes de jogá-lo do outro lado do quarto.

[Por que o mundo deve me desafiar assim?? Mesmo minha pesquisa não está indo como eu planejei! O mundo precisa de mim se quisermos fundir as quatro afinidades. Depois de dominar isso, posso fazer o resto sozinho! Eu não vou precisar daquele pedaço de lixo da Flamm ou daqueles outros perdedores!], ele passou as mãos pelo cabelo enquanto sua mente corria em uma tentativa desesperada de encontrar uma maneira de mudar sua fortuna.
Os pensamentos do Jean foram interrompidos pelo som de uma batida forte na porta.

[Quem quer que seja, dê o fora daqui!] (Jean)

Ele não está com disposição para visitas, mas a voz do outro lado da porta persistiu.

[Jean, sou eu... Maria] (Maria)
Ela deveria estar de volta à catedral agora que seu encontro com o Linus havia terminado, mas ele não estava disposto a recusar uma mulher de habito a esta hora. Com um estalido irritado de sua língua, Jean se levantou de sua cadeira e soltou a fechadura antes de abrir a porta para encarar sua convidada indesejada. [O que?] (Jean)
[É dever daquelas que seguem o caminho sagrado pastorear cordeiros rebeldes, você sabe] (Maria)
[Nem mesmo finja que você sabe como me sinto] (Jean)
[Mas você perdeu o seu caminho, não?] (Maria)
Jean estalou a língua mais uma vez em aborrecimento. [Eu acho que você é a única que está perdida, senhorita] (Jean)
[E o que te faz dizer isso?] (Maria)
[Eu não sei. Parece que você está sempre usando algum tipo de máscara. É revoltante, para falar a verdade] (Jean)

Jean se inclinou, inspecionando de perto cada traço do rosto da Maria.

[Mas há algo diferente em você agora], um sorriso sinistro enfeitou seus lábios enquanto ele falava. [Você não é algum tipo de bruxa malvada fingindo ser humana agora, é?] (Jean)

Seu olhar frio fez a Maria estremecer internamente.

[Aah, então você se viu ligado ao Linus, não é?] (Jean)
[Isso não tem nada a ver com ele!] (Maria)
[Meu meu. Muito emocional, não é? Isso definitivamente não é como você] (Jean)

Maria fez uma careta em silêncio.

[Vejo que você não gosta que eu diga o nome do homem que você ama? Ah. Plebeu ou clero, vocês são todos iguais no final. Você é uma mulher, afinal. Gyahahaha!] (Jean)
[Jean, sua escória patética!!], Maria levantou a mão para dar um tapa na bochecha dele... mas seu braço ficou congelado no lugar, tremendo de raiva mal contida. Ela apertou a mandíbula e esperou que sua mente racional voltasse, e a raiva diminuiu.
[Meu, meu, que louvável de sua parte], Jean zombou. [Estou surpreso que uma mulher santa se contenha dessa maneira] (Jean)
Maria baixou lentamente a mão com um suspiro pesado. [Como eu disse, é nosso trabalho ajudar cordeiros rebeldes] (Maria)
[Sim, você continua dizendo isso. Por que você simplesmente não pula o sermão e vai direto ao ponto? Eu sou um homem ocupado] (Jean)

Finalmente ambos estão calmos o suficiente para ter uma conversa racional. Maria pegou um cristal negro e o mostrou ao homem arrogante à sua frente. Seu habitual sorriso gentil voltou ao seu rosto.

[Ouvi dizer que você estava buscando mais poder], disse ela. [Achei que esta ferramenta poderia ser de alguma utilidade para você] (Maria)

Uma energia poderosa girou profundamente dentro do cristal, como uma tempestade tivesse sido contida ali. Jean olhou para ela atentamente como se estivesse em transe.

[Meu, meu], ele disse. [Você certamente me trouxe algo intrigante] (Jean)